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Adeus a esta plataforma, migramos!

 Queridos leitores,


Este será o último post desta plataforma do Blogger, onde ficamos por 15 anos. 

De hoje em diante migramos para o novo site da Outubro Edições: www.outubroedicoes.com.br 

Lá manteremos em atividade este blog, com todos os posts de sua história, todos os comentários, tudo. E seguiremos atualizando-o com leituras e comentários, como fazemos há 15 anos.

Além de tudo, lá começa a funcionar a partir de hoje a lojinha virtual da Outubro Edições, com meus livros e de outros autores, cronograma de atividades, dicas e muito mais. 

Visite-nos! Vocês continuam sempre muito bem-vindos!

https://www.outubroedicoes.com.br/



Clara Arreguy, quarta-feira, março 03, 2021. 0 comentário(s).

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Dualidades em conflito e complemento

Não é porque foi aniversário dela ontem, mas a Beatriz Leal Craveiro acaba de presentear o leitor com seu novo romance, Elefantes barrem (Penalux), que, após alguns contos premiados, se segue ao renomado Mulheres que mordem, finalista no Jabuti de 2015. 

As qualidades observadas na estreia de Bia Leal estão presentes neste segundo romance. A linguagem precisa, profunda, irônica. A pesquisa que lhe permite abordar os assuntos pretendidos com a segurança de quem sabe o que está falando. A sensibilidade na criação e no desenvolvimento de personagens complexos.

Se em Mulheres que mordem as mães da Praça de Maio da Argentina (e as filhas, no caso da protagonista) eram o foco central, aqui temos duas irmãs gêmeas, com suas personalidades quase antagônicas, mas igualmente o conflito entre a complementaridade e a rivalidade. A firmeza de Lívia versus a insegurança de Lavínia. Desejos entrecruzados na procura de felicidade e realização, essa miragem à frente de qualquer uma.

Enquanto no romance anterior o protagonista masculino (o pai torturador) deixava margem a dúvidas quanto à sua coerência (nas sessões de análise em que revela como torturava), também aqui os dois homens, Orlando, o pai, e Ronaldo, o namorado (anagramas um do outro) igualmente resvalam em uma composição menos bem acabada do que no caso das mulheres. A desagregação de Orlando, que o encaminha para a vida na rua, soa um tanto extrema como solução para seu transtorno meio que TOC. E em Ronaldo ela se aprofunda pouco em comparação com as outras personagens.  

Nada que comprometa a credibilidade do romance. Beatriz Leal Craveiro escreve muito bem, leem-se seus livros com fluidez e a fruição da frase bem construída, da palavra bem colocada, do ritmo cuidadosamente atribuído. Cada voz tem sua dicção, cada capítulo conduz ao próximo um leitor sedento de saber tudo até o final.

Parabéns, Bia Leal, por mais esse acerto!


Clara Arreguy, segunda-feira, dezembro 14, 2020. 0 comentário(s).

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Uma saga do Brasil latino-americano


Esta semana nosso clube de leitura teve a alegria de receber a escritora Maria José Silveira, autora de Maria Altamira (Editora Instante), livro que lemos este mês e que nos encantou a todos. Primeiro, porque a história é muito boa, e Maria José sabe contar histórias. Aqui são duas as protagonistas: Alelí e sua filha, Maria Altamira. Alelí é uma sobrevivente do soterramento de Yungay, no Peru, quando um vilarejo foi varrido do mapa depois de um terremoto. Após perder toda a família, inclusive a filhinha, a jovem sai vagando pela América Latina e, ao longo dos anos, atravessa Andes e vales, florestas, estradas e vilas. Aprende a tocar um charango, instrumento musical que a acompanha na voz da dor e da solidão. Até que um dia conhece um juruna que a ama e com quem tem outra filha.

Aí começa a outra parte da história, em que Maria Altamira, moradora na cidade amazônica que lhe deu nome, enfrenta a chegada dos novos tempos representados pela hidrelétrica de Belo Monte. Diante da mineração, do garimpo, da exploração dos madeireiros e de toda a devastação ambiental, humana e cultural, Maria se torna uma lutadora, uma defensora dos indígenas (que ela não deixa de ser), também passa por suas peripécias, mora um tempo em São Paulo, conhece os movimentos por moradia, enfim, aprende as diversas faces de um Brasil contemporâneo assediado por todos os lados, norte e sul, campo e cidade, meio ambiente, história, modos de vida.

O mais interessante no livro de Maria José Silveira é que ele me parece a contraface de seu outro romance que li e comentei aqui alguns anos atrás, A mãe da mãe de sua mãe e suas filhas (Globo Livros). Nesse a escritora traça uma árvore genealógica de linhagem feminina, começando pela primeira indígena a se ligar a um europeu que veio na esquadra de Cabral. Daí em diante, acompanhamos 21 gerações de mulheres até chegar aos nossos dias. Um retrato interessantíssimo da formação do povo brasileiro pelos encontros e desencontros, afetos e sujeições entre indígenas, africanos, europeus, asiáticos, judeus, árabes, toda a gama, enfim, que se misturou no caldeirão da nossa história.

Com Maria Altamira, a autora complementa essa linhagem com os primos da América do Sul, nossos irmãos de continente, tão próximos e tão distantes, cuja saga de resistência se cruza inexoravelmente com a brasileira. Alelí e sua peregrinação, Maria Altamira e seu engajamento, o Brasil inserido na América Latina, com os mesmos problemas e as mesmas veias líricas.


Clara Arreguy, quarta-feira, dezembro 09, 2020. 1 comentário(s).

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Centro, Centrão e o caminho do meio

 


Adoro séries, sobretudo as políticas, as históricas, as policiais e as de ficção científica, e de preferência produzidas em países que não sejam os EUA (Suécia, Islândia, Croácia, Turquia, Brasil, Espanha). No momento assisto à dinamarquesa Borgen, ficção sobre a deputada Birgitte Nyborg, primeira-ministra, caracterizada pelo excelente domínio da política e pelas dificuldades em lidar com a vida pessoal.
Nyborg é do partido Moderado, o exato centro entre uma esquerda hipócrita e contraditória e uma direita sem empatia, contrária aos direitos humanos e à preservação do meio ambiente, entre outras pautas óbvias. O interessante é observar que a ficção, em busca de credibilidade, aposta que nem direita nem esquerda podem ter razão, cabendo ao centro a sensatez, o equilíbrio do "caminho do meio".
(Alerta de spoiler) A certa altura da série os Moderados se aliam à direita, renunciando àquelas pautas humanistas, o que leva Nyborg a fundar outro partido, os Novos Democratas. No debate eleitoral, ela desmascara os antigos aliados: vocês não são mais o centro, nós é que somos.
Fico rindo dessa busca da virtude no caminho do meio e comparando com o Brasil. Aqui, de uma hora pra outra, a grande mídia e seus "analistas políticos" resolveram eleger como centro todos os partidos de direita, como o PP (que era o PDS, continuação da Arena, partido de sustentação da ditadura), o DEM (braço mais liberal da mesma Arena), e os do chamado Centrão.
"Esquecem-se" que o termo Centrão foi cunhado de forma irônica, como uma piada, para se referir aos partidos fisiológicos de pouca definição ideológica, que se aliavam (e aliam) a quem der mais. Integraram os governos petistas, governaram o país com suas principais lideranças ocupando ministérios e outros postos-chave da estrutura de governo, e estão de volta, todos felizes, nos braços do bolsonarismo.
Esses partidos nada têm de centro, nunca tiveram. Quando têm que explicitar seus programas, são eles tão neoliberais quanto quaisquer outros partidos de direita. Como hoje é o próprio PSDB, que nasceu social-democrata mas há muito tomou partido contrário às pautas da social democracia, como a distribuição de renda, o Estado de bem-estar social, a saúde e a educação públicas e de qualidade. A privatização em massa iniciada nos governos tucanos não dá margem a dúvidas quanto ao espectro ideológico dos "centristas" brasileiros.
Essa disputa pelo centro vai longe. O dia seguinte às eleições municipais de 2020 abriu a campanha para as presidenciais de 2022, com a eleição, pela grande mídia e o grande capital, que ela representa, do centro como expressão política capaz de pôr fim à polarização que todos combatem. Deixando pra chamar de direita só a extrema direita bolsonarista, que todos execram, pelo menos da boca pra fora.
Mais uma disputa de narrativas, pois negar a polarização é fingir que não existe luta de classes. E só à direita interessa a encenação de que é possível atender aos interesses de todos. Todos é muita gente pra caber no balaio da nossa elite dominante. Eles têm lado, e não é o nosso, do povo brasileiro.
Se Birgitte Nyborg conhecesse os "centristas" brasileiros, sairia correndo desse campo. Ela também tem lado, embora finja que não.

Clara Arreguy, quarta-feira, dezembro 02, 2020. 0 comentário(s).

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Adão, Eva e muito mais


Já há uns dois anos que um grupo, coordenado pelo professor Nathan Kacowicz, vem estudando os mitos de Adão e Eva a partir da Bíblia, mas também com enfoque em releituras literárias e de outras expressões artísticas ao longo dos tempos. Esse tema integra uma proposta de estudos coletivos que vão da Cabala a religiões comparadas, num misto de filosofia, história e literatura.

Sobre Adão e Eva, passeamos por John Milton, Mark Twain, Machado de Assis, imagens do classicismo e da Renascença, num mergulho que procura entender, a partir do mito, suas mil possíveis interpretações literais, míticas propriamente, simbólicas, etc. O que é e qual o papel do homem? E da mulher? E da relação homem-mulher? É pano pra manga.

O livro Eva-Proto-Poeta, de Adriane Garcia (Caos&Letras), vem contribuir de forma incrivelmente atual para esse debate. Além de boa poesia, como se caracteriza toda a obra da poeta mineira, os versos contidos nessa espécie de "diário da queda" alimentam a leitura de que nasce no Gênesis e nas suas interpretações a misoginia original, a que confere à mulher a culpa na queda da humanidade, a que a estigmatiza por seus dons e poderes.

Adriane Garcia o faz com poesia e graça, em todos os sentidos. Não se atém a Adão e Eva, claro, mas introduz entre os protagonistas dessa história Lilith, a que não se submeteu (veja em "Kama Sutra": Adão / Essa propaganda enganosa / Não variava), Samael, o anjo decaído, novas possibilidades para o tédio do paraíso e a busca de alegria e felicidade. Brinca com o deus que inventa as perguntas retóricas, com aspectos que podem e merecem uma releitura atual, feminista, radical.

Delícia de manifesto, de contribuição para as eternas perguntas que envolvem os gêneros e o humano em toda a sua amplitude. Delícia ler os versos de Adriane Garcia e imaginar o que estamos fazendo conosco, homens, mulheres, todas as pessoas, em busca de um lugar e um papel sempre a construir.


Clara Arreguy, segunda-feira, novembro 30, 2020. 1 comentário(s).

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Divanize, nossa diva


A querida amiga Divanize Carbonieri comentou no Facebook que agora que seu livro é finalista no Jabuti muita gente correu a lê-lo. Mea culpa, mea máxima culpa. A coincidência é que o autógrafo que recebi no meu exemplar tem exatamente um ano, quando nos encontramos no Mulherio das Letras de 2019, em Natal. O livro estava na minha cabeceira, naquela ordem insondável em que se empilham is que compro e ganho, sem muito critério. A pauta que tira um ou outro e o traz pra minha leitura varia. Confesso que a indicação do romance Cárcere Privado, de Margarida Patriota, ao prêmio Oceanos, e de Passagem Estreita, de Divaniza Carbonieri, ao Jabuti, lhes deu preferência pra furar a fila.

Conheço Divanize do Mulherio - fizemos juntas uma oficina em 2018 e de lá pra cá nos acompanhamos nas redes e nos encontros presenciais. Ela é incansável: poeta, contista, professora, orientadora, editora de revista, agitadora cultural, animadora da gente, das suas parceiras e irmãs na luta das mulheres por espaço e respeito na cena literária. Ela é muito mais ativa que a maioria em tudo que faz, o que por si só já a faz merecer o respeito de todas nós. Mas o melhor de tudo é que Divanize é uma grande escritora. A presença de seu livro entre os finalistas da mais conhecida premiação brasileira só corrobora isso.

Passagem Estreita reúne 19 contos protagonizados basicamente por mulheres - a exceção se dá quando o protagonista é uma cidade, Cuiabá, lugar que essa paulista elegeu para viver e lutar. Mas ela não escreve sobre mulheres quaisquer. São figuras em geral sofridas, que se acham feias, menores, quase merecedoras das violências às quais são submetidas. Ainda que possam crescer, aprender, estudar, candidatar-se a presidenta da república, como no conto "Fia". 

Além de falar sobre o ser mulher, sobre opressão, uma das coisas que Divanize faz melhor é brincar com a linguagem. Ela se permite explorar várias vozes, vários estilos, desde a alternância de discursos num mesmo conto até a invenção de palavras e de construções, ao sabor da subjetividade do narrador. Ou da narradora. Com brincadeiras em torno da palavra, da pontuação, dos discursos contemporâneos, das formas de violência contidas em atos e em palavras, a escritora percorre ampla gama de situações atuais, capazes de tocar o leitor na sensibilidade e na racionalidade. Às vezes comove, às vezes indigna. Mas sempre mexe com a gente. Parabéns, Diva, pela bela obra!



Clara Arreguy, quarta-feira, novembro 04, 2020. 0 comentário(s).

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A deliciosa trama de Guillaume Musso

 

E nessa temporada de conhecer novos autores, ou melhor, autores que nunca tinha lido, cheguei ao francês Guillaume Musso, de A Vida Secreta dos Escritores (L&PM), romance que navega naquela onda de metalinguagem que tenho comentado aqui por causa de outras leituras, como as de Jacques Fux e José Luís Peixoto. A trama desse delicioso romance explora a mistura de ficção com realidade, mas na verdade tudo é literatura.

Conta a história de um escritor, Nathan Fawles, que, após três livros de sucesso estrondoso, se recolhe numa pequena ilha onde se isola do mundo e jura nunca mais escrever uma linha sequer, nem dar entrevistas, nem falar sobre a curta carreira de escritor de best-sellers. Um mistério ronda a vida pessoal da intrigante figura, que cita o norte-americano J.D. Salinger, de O Apanhador no Campo de Centeio e nos lembra também o brasileiro Raduan Nassar, outro a se recolher após lançar "apenas" três obras-primas. O romance, aliás, é repleto de citações, não apenas do que o leitor medianamente bem informado identifica, mas de uma porção de livros e filmes mais ou menos conhecidos.

Em A Vida Secreta dos Escritores, acompanhamos um jovem candidato a romancista que consegue um emprego sazonal na livraria dessa pequena ilha onde se esconde Nathan Fawles. É a oportunidade que ele encontra para tentar se aproximar de seu ídolo. Mas outra pessoa também tem as mesmas intenções: uma jornalista ligada a uma história do passado de Fawles. Um crime na pacata ilha leva a polícia a fechar o local, em citação daqueles romances de Agatha Christie em que suspeitos e vítimas se veem confinados no mesmo espaço, e a trama se enovela cada vez mais.

Narrativa ágil, personagens intrigantes, suspense, mistério - e aulas de letras - colaboram pra fazer do romance uma leitura que não se larga antes do fim. Não antes de o autor, Musso, explicar tintim por tintim o que é real e o que é invenção nesse imbroglio todo.

 


Clara Arreguy, terça-feira, novembro 03, 2020. 0 comentário(s).

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